Esse conto é baseado em fragmentos que usei na resenha de SLA Industries (um RPG). Resolvi tornar um conto e tirar referências do universo original, e em vez disso, incluir elementos do Recife-Ciber-Lama, mas obviamente, com outro protagonista.
Era até poético. O rosto da slholoa no asfalto, 4 finos cortes que percorriam sua linda face. A chuva que caia em seu rosto formava um caminho perfeito e curto até o chão, uma rota de lágrimas. Um dos olhos fora estourado por um dos cortes, o outro permanecia aberto. Um azul tempestade e a pele de um dourado brilhante, tão bela. Ela era muito bonita. Pedi a um holo para pegar um saco menor para a cabeça. Tinhamos de achar o corpo, podia haver pistas. Lembro de, naquele momento, ter verificado a arma. Tudo bem com ela, então tudo bem comigo, é o que eu sempre digo. Levantei o capuz e continuei no meio da chuva fina e fria e suja. A pergunta que girava em minha cabeça era: Qual dos assassinos seriais daquela semana teria matado uma prostituta fina, na periferia da cidade? Nenhum se encaixava, de acordo com as rotas, horário e modus operandi. Podia ser um assassino serial com defeito? Se fosse isso, era o que eu tinha de descobrir, e logo.
O meu parceiro estava no hospital, problemas com a esposa, sabe? Sendo assim, fiz todo o trabalho, e acabei em um maldito pulgueiro. O nome do suspeito era Enkidu, um canalha dos mais baixos. Eu francamente não acreditava que ele tivesse a competência para ter cometido aquele crime, ou até para comer sozinho, mas cada contato que eu tinha apontava para ele, e os exames de DNA confirmavam que o assassino era um akadiano, o que também batia com o Enkidu.
Logo que cheguei ao andar onde ele devia estar, um jato flamejante deixou minhas sobrancelhas mais curtas. Atirei as cegas na direção das chamas e gritei por holos. Corri em direção ao quarto dele, esperando mais surpresas, mas ele já havia desistido, e fugiu pela janela. Os holos não o encontraram nas redondezas, mas como confiar neles em relação a um akadian? A tecnologia era deles afinal.
Admito, sou preconceituoso. Os caras chegam aqui, vindo sei lá de onde, e em troca de um local para ficar, nos oferecem uma tecnologia que muda toda a sociedade. Não, não gosto mesmo deles e acho que quem confia neles é um idiota.
No apartamento dele achei algumas drogas e coloquei no meu bolso antes que os holos entrassem. E uma mono, possivelmente a faca que ele usou no rosto da slholoa. Ele devia ter bons contatos no mercado negro para conseguir esse material. Só agentes do Sistema podem portar mono-lâminas. Achei também uma espécie de agenda criptografada, e retratos de algumas prostitutas slholoa, inclusive de Seda, morta na semana anterior. Eu não tinha mais dúvidas.
Uma semana depois de ter invadindo o apartamento do filho da puta e eu ainda estava na mesma merda. Enkidu tinha melhores contatos e apoio do que eu havia imaginado. Tudo parecia uma grande bosta. Mesmo com a ajuda de Kiriu, recuperado da tentativa de envenenamento, não havia mais sinal do assassino. Eu e Kiriu estávamos tentando vigiar da melhor forma possível as prostitutas slholoa, e até requisitamos que fossem vigiadas por holos, mas desde a invasão do esconderijo de Enkidu, ele havia degolado mais duas piranhas e demonstrado uma competência que não batia com o bandido de quinta que as pessoas diziam que ele era. Nada batia. Ele morava num ninho de baratas, mas tinhas equipamento de primeira, fora preso por bebedeira, venda de drogas leves, mas conseguia matar as slholoa com precisão e quando menos esperávamos. E isso sem falar na quantidade ridícula de burocracia que envolvia esse caso. Eu achava que era por conta das slholoa, mas agora começava a ter dúvidas.
Então, só sobravam mais duas daquelas que estavam nas fotos que achei no pulgueiro. Kiriu foi vigiar uma delas, Diamante, uma bela slholoa, e assim como as outras, uma prostituta de luxo. Eu fiquei encarregado de olhar outra, Estrela Brilhante (em que merda de lugar os técnicos arranjam esses nomes para as slholoa?), e esta parecia mais promissora. Só dava por um monte de dinheiro, e a altos executivos do Sistema. Infelizmente, a próxima vítima não foi essa, e o Kiriu teve que cuidar do Enkidu. Kiriu é muito, mas muito burro mesmo, mas é também bi-campeão recifense de tiro. Eu soube que não sobrou muito do Enkidu, e mesmo tendo quase torrado o Kiriu, ele foi morto antes de pegar outra vítima. Ponto para os caras bonzinhos.
Bem, tudo parecia okay, inclusive o bônus "paralelo" pela cabeça do canalha. Mas logo percebi que estava sendo seguido. Não, eu não via ninguém, mas sabe quando você tem essa sensação? Pois é, e ela estava me acompanhando sempre. Então, Kiriu, e mais dois outros civis do Sistema, fomos fazer uma ronda noturna e uma batida em Camaragibe. Lugarzinho infernal, mas nada comparável ao Alto do Mandu.
O lugar não parecia representar mais perigo que o normal e ninguém se mete com a civil. Estávamos despreocupados. Iamos entrar, apagar os caras, sair, ligar para a PM que viria recolher os corpos junto com o pessoa do IML. Rotina. Até que um slholoa saiu atirando e levou de cara Jorginho e Koto, os dois outros caras da civil...
Kiriu e eu sobrevivemos ao tiroteio, mas mal, muito mal. E o slholoa estava limpo. Nunca vi um deles tão limpo assim. Sem código de fabricação, marcações de modelo, nada. Meu braço temia de dor, mas Kiriu estava pior. Tentamos voltar para o distrito, mas tivemos de sobreviver a um ataque de gangues e não conseguimos sequer sair de Camaragibe sem que antes estourassem o carro.
Mas por sorte do que por habilidade, chegamos a um apartamento que o Sistema mantém como refúgio. Kiriu morreu poucas horas depois de termos chegado lá. Nenhuma ambulância do sistema veio, nenhum médico, nenhum auxílio. Não tenho mais dúvidas, eu estou tão morto quanto ele. Após ele morrer, passei as últimas horas decifrando a agenda que retirei do quarto de Enkidu.
Posso ouvir seus passos. Vai ser como naquela antiga música, "bang, bang", e estarei morto. O segredo dos slholoa morre comigo. E todos pensando que os akadianos vieram de algum outro planeta, em vez de nosso futuro, que os slholoa não são mais que.bang.bang...bang.
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