April 23, 2012

Ain't No Sunshine


Uma vez eu comi uma salada...
o dia estava quente, chovia lá fora e se ouviam tiros.
Quando Ricardo ligou, pulei para atender ao telefone.
Sem dinheiro já fazia 30 dias, estava me alimentando de livros e revistas.
(Desconfio que a tarja com o valor nutritivo delas é falaciosa)
No mês anterior ainda tinha conseguido me sustentar.
Por algum motivo, minhas cuecas atingem um valor alto no mercado negro de Bangkok.
(Não, não vou lhes revelar meu contato)
Ele queria fazer dinheiro e queria que eu o ajudasse.
Fazer dinheiro não é bem o termo técnico para "rouba a bancos", mas serve.
Mas, com Ricardo, sempre tinha "epa!". Nessa caso, o o "epa!" era duplo:
O dinheiro pertencia a Fukujama Udson-Demian Eletric Urbs,
maior fabricante de Holos da América Biônica (includindo a AL, exceto Argentina, claro),
e existia na forma de 3 protótipos de novos Holos na sua estação no L1.
Limpei Álvarez de Azevedo e Playboy da boca com um resto de Stephen King e fui pegar o próximo ônibus.
Ele partia para a Lua em 4 horas.
Ricardo havia pago a passagem e entre no circular em uma cabine de luxo.
Tínhamos mesmo a opção de escolher entre vários alimentos e cozinharmos nós mesmos.
Escolho uns empanados de frango e apertei os botões certo na máquina.
Como com vodka (que descobri que é um homônimo de "Deus" em russo).
A viagem não demora mais de meia-hora.
Daí o apelido de "cozinha lunar", mal temos temos de cozinhar e comer e já chegamos.

A Lua é um lugar estranho.
Especialmente sem ela. Lunara.
Lembro da última vez que nos falamos.
- Estou com insônia.
- Porque não me ligou?
- Vou te ligar as duas pra gente sair?
- Eu acho sexy.
E nunca mais tive notícias dela. Claro, eu tive notícias sobre a cidade dela.
Mas odeio pensar sobre acidentes geotérmicos pela manhã. Vulcões artificiais...
Vou andando nos corredores apertados e pensando no que fazer em relação a segurança.
Os dados que Ricardo me passou tem pelo menos dois meses.
Antigamente isso não ser nada, mas hoje? Com IA recursivas guardando tudo?
Como entrar no porto da FUDEU para ir ao L1 se os dados estiverem errados?
Eu paro de pensar quando chega na porta do complexo multinacional de sedes das multiplanetárias.
O Scan, bem, me escaneia e não acha nada.
Talvez algo de um desprazer por ler um dostoiévski mal traduzido, mas só.
E eu entro.

O lugar é bem guardado. Há holos e humanos.
Eu pego o chiclete e começo a mascar.
Devo ficar invisível por uns 5 minutos, mais ou menos.
Saio até uma área de maior nuvem e tento fritar alguma coisa.
Doi holos apagam. Os outros se armam.
Os humanos percebem tarde demais e já estou mascando outro chiclete.
Sem alarme for you, babe.
Os nanis transformam meu braço esquerdo em um monofilamento e meus últimos segundos de invisibilidade eu gasto cortando tudo a minha volta com dois rápidos rodopios.
Os humanos só sabem que morreram quando tentam respirar.
Os holos restantes avançam.
Eu corro. Desatacho o monofilamento no caminho e eles entra em rápida reação, causando um EMP.
Meu backup funciona dois segundos depois. Meu córtex principal, frito, como os holos.
Merda de blindagem que você me vendeu, Dayvidson, seu bosta.
As IAs já estão reagindo e meu sistema mostra alertas em toda a estação.
Entro por um tudo de acesso, e me preparo para ser disparado para a superfície da Lua.
Tenho 3 minutos.
Espaço, a última fronteira.
Yahoo!
Olho o outro tubo de acesso e vou bailando até ele.
Bem 2001.
O caminhar, dançar, saltos tronchos, é patético.
2 minutos.
Chego ao tubo de acesso.
Ricardo me garantiu que estaria aberto.
Está.
Entro.
Dois Holos. Ainda não há ar.
Ar.
Um Holo tenta me eletrocutar.
Encurtar.
Ar.
Essa bindagem funciona, valeu Gregiz.
Eu inverto eles. Os nanis caem e os sugo, posso precisar deles depois.
Ar.
Fecho tudo, mando ar entrar.
Por pouco. A IA reage.
Tenta despressurizar, mas entro mais na estação.
Ele me dispara para L1.

Eu acoplo. E não há nada de sexual nisso.
Só dois objetos no espaço.
Infelizmente.
Os protótipos estão logo a frente.
A sala limpa, eu sujo.
São verdadeiros cofre fortes.
Eu deixo cair outro seguimento do braço e os nanitas cruzam o espaço.
A fórmula se combina ao material dos cofres.
Muita fumaça. Fica difícil de ver.
Assim que os cofres se dissolvem, a cápsula explode.
Meu olho esquerdo para de transmitir, assim como parte de meu corpo.
Eu entro em modo de hibernação e me movo em direção a Lua novamente.

Nunca chego lá.
Sou pego.
Por um táxi lunar.
O piloto, de cabeleira vermelha, me rende fácil.
Pois é, Ricardo, pense numa "epa!"
Eles me capturam e me me obrigam a fazer essa recaptulação de tudo.
A primeira coisa que lembro, é da salada.
No fim das contas, podia ser bem pior.
Podiam ter me torrado.
Ou me fazer comer livros e revistas de novo.
Pelo menos a comida é boa.
Cansei mesmo do Dostoiévski.
Azedava a salada brincando.

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