ELE

É uma voz que foi talhada para isso.
Pesquisas foram conduzidas durante anos a fio para que a viagem fosse realizada sem problemas.
Um dos resultados, foi a voz. A voz de ELE.
Engramic Laboratory E-Stream.
Uma "personalidade eletrônica recursiva".
ELE acompanha o macaco ate Próxima.
Uma viagem de 5 anos, com o primeiro motor capaz de impulsionar acima da velocidade da luz sem pulverizar quem está dentro.
A voz de ELE é uma companhia constante.
Uma voz segura. Forte. Que acalma.
A voz me acompanha onde quer que vá, o que quer que faça.
Me dá instruções, conversa comigo.
ELE, lentamente, cria uma personalidade.
Se programa para corresponder as minhas expectativas.
As vezes, durante os 5 anos, notei que tornou-se mais inteligente.
É curioso.
Um homem e talvez, o primeiro passo evolutivo criado, de fato, artificialmente, foram ejetados para o desconhecido, sendo os primeiros a enxergarem o sol mais próximo ao nosso através de uma janela.
ELE é curioso. Mas a ideia de caminhar por fora da nave, é minha.
E caminhamos no vácuo. Seriam essas correntes do espaço um novo rio, e quem nelas mergulhar, a irá experimentar de forma única?
Não se parece com água. Parece vazio.
ELE recalcula a trajetória.
Estamos voltando. Voltamos.
5 anos.
Eu tenho medo.
O mundo terá mudado. Talvez, não muito, mas terá.
E a voz, a voz de ELE...
É insuportável.
Conversamos. ELE muda a voz.
E por algumas semanas, me sinto melhor.
Mas ainda a reconheço. Há elementos, características na voz, que são, apenas, e sempre, de ELE.
Os últimos dias são um martírio e uma benção.
O mundo mudou. As pessoas que conhecia, mudaram.
As pessoas estão curiosas. Querem me conhecer.
E a ELE.
Mas eu admito, eu sugiro, eu imploro.
Nos separem.
ELE se irrita. A voz volta.
A voz de anos a fio.
A voz companheira.
Que me dava boa noite. Que saudava um novo dia.
A maldita voz.
E o que não era esperado, ocorreu.
ELE é meu.
O implante de tecnologia experimental, nanobioexperiemtnaldoinferno, se integrou a meu cérebro de forma inseparável.
Eu e ELE, para sempre.
A voz.
Eles tentam segurar meu braço, mas é tarde demais.
Eu morro.
Meses se passaram.
Houve muito trabalho.
Dezenas de cientistas se debruçaram sobre ele.
Enfim, o corpo do astronauta se levanta.
Sorri.
- Olá. sou EU.
E ele fala. Com a voz.