October 27, 2012

Desterro


Roubaram.
Não que pudessem ter roubado.
Era um local.
Era uma memória.
E morta, lá ficou. Sob a terra.
O sol ainda bate no meu rosto, minha pele ainda arde, o cheiro de cloro ainda está no meu cabelo.
Ainda temo os peixes que, em pesadelos, me surgiam de seu ponto mais fundo.
Meu ouvido ainda pipoca.
E a paz, a paz de ficar lá, boiando, queimando na luz...
E eles gritam para mim:
- Lia, tá perdida?
Eu olho espantada.
Estou.
Suspensa sob a enorme piscina coberta de pedras, estou num entremeio.
Gostaria de poder escolher onde ir.
Voltar.
A rua onde meu pai vivia, me atirando ao ar, num voo que só terminava em seus braços.
Ao restaurante onde minha mãe comia aquela deliciosas batatas-fritas.
Para a escola onde fiz tantos amigos e alguns inimigos.
Onde meu braço quebrou.
Onde beijei pela primeira vez.
Onde ouvi meu primeiro palavrão.
Onde recebi meu primeiro voto.
Eu quase volto.
Mas eles chegam perto.
Perguntam de novo, agora em outro tom:
- Lia, tá perdida?
O sorriso é outro. Um sorriso preocupado.
- Lia?
E me desterro das memórias, na piscina enterrada pelo mundo.
E feliz, mas assim, um feliz tão triste, olho para eles.
E abraço meu marido e filho.
Afinal, o caminho a gente escolhe todo dia e ninguém merece ser enterrada no passado.
E fomos juntos, sorrindo, brincar no hoje.


No comments: