October 11, 2012
Nightwhats
A chuva começa repentina e me arrependo. O guarda-chuva que não veio passear. Não vejo ainda jacarés no campus, mas exploro de forma diletante, caminhando de
volta do trabalho, a sua inusitada fauna desurbana.
A noite, recheada de timbús, saguis e sapos, não deve me surpreender mais.
Exceto pelos raios em meus calcanhares.
Corro para a lanchonete, o único decente abrigo que vejo.
Tênue como for.
Afinal, não passa de um trailer, mal se protege da chuva.
Peço um sanduíche e cerveja. Algo quente e algo que me faça relaxar. Comida de conforto depois de um longo dia.
Não olho para a teve, posicionada para a única mesa do lugar, no qual um casal se encolhe.
E mais raios.
E a noite consegue ficar ainda mais escura.
Precavido, o rapaz que me atendeu e frita os ingredientes do sanduíche, puxa de uma gaveta, uma vela.
Poupa então os celulares, que parecem iluminar o teto do trailer por alguns instantes, como holofotes nas noites de Londres em dias de raids.
A loira chega em um carro caro.
Se junta a mim no balcão.
Olhos verdes, corpo bonito, cega como uma toupeira - fato que não cansa de lembrar ao não ver os rótulos de refrigerantes, ou mesmo o menu, iluminado pela moça que ajuda o rapaz da lanchonete (nunca a vi antes, acho que é paquera dele), assim como pelo meu próprio celular.
O casal, afastado de nós, olha sem esperanças para a chuva e para o rio que parece se formar da rua.
Chegam mais refugiados.
O casal de gays faz seu pedido e se recolhe em um canto.
Um motoqueiro surge logo depois. Demora bastante na escolha. Não há bacon. Terá de mudar o pedido. Como viver sem bacon, certo?
No meu pedido, a substituição é feita com mais calabresa. Não reclamo.
Chegam mais dois. Um dos homens reconhece a loira.
Ela lembra dele, inicialmente, apenas vagamente.
Em instantes, tornam-se grandes amigos.
Noto pela conversa, quase no meu pé de ouvido, que ela é cantora, ele, tatuador.
Meu sanduíche chega, parece que foi aquecido a vela.
A cerveja que acompanha, nem tão gelada.
O casal vai embora.
O motoqueiro também.
O casal gay não demora.
A loira, que leva o pedido para o marido e filho, deixa a lanchonete com um sorriso.
O tatuador, que é hoje, vigia, olha para mim e confidencia:
- Que tatuagem eu fiz nela...
- Bonita?
- Na tabaca.
- Sério?
Ele confirma com a cabeça e completa: "só reconheci ela assim, esqueço a cara, mas nunca uma tabaca."
Paguei a comida e a cerveja.
E na chuva, fui embora para meu canto anormal do mundo.
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