March 09, 2012
Fragrância
Ela era doce. Doce como a noite. Seu sorriso, um convite aberto. Presos, seus cabelos negros distoavam de seu calor, e contrastavam com sua pele alva.
O bar estava apinhado de gente e ainda assim, ela me capturou em um instante. Não tive escolha e caminhava para ela ignorando brutamentos e amantes.
Ela tinha algo de petulante, num arrebitar de nariz ou primir dos lábios, mas ela disfarça bem quando as amigas não olham.
Eu sei que estou fazendo tudo errado. Quem entra num bar e vai em direta linha reta para uma mesa com três mulheres que desconhece?
Duas, que nunca lhe chamaram sua atenção. Outra que preenche o local com um magnetismo, uma...fragrância que pereço ser o único a notar.
E o que há de especial nela? Não é como as amazonas com quem costumo sair, aliás, é baixinha, gordinha. Há sim, uma beleza exótica em seus olhos castanhos de Cleópatra, em suas maças do rosto saliente, uma beleza felina.
Chego na mesa, dou meu melhor sorriso. Claro, ela me ignoram.
Resignado, vou para o balcão, peço uma cerveja. Tenho vontade de olhar pra ela, mas evito.
Então, sua mão toca meu braço.
- Oi.
Seu sorriso me devora. Minha atenção é rudemente tomada para ela, sem chance de fuga.
- Olá.
Foi a coisa mais inteligente que consegui pensar em dizer.
- Você é sempre assim, atirado?
- Não. Você é?
Ela sorri. Eu me sinto como um animal diante de faróis de milha.
- Também não. Olha, minha amigas estão indo. Quer sentar comigo?
Havia o que quiser? Concordei com a cabeça, um sorriso e fui.
Ela é estudante de Farmácia. Me fala dos seus projetos, como gosta de se envolver com tudo que faz. Me fala de seu orquidário.
Conversamos muito. Falo de mim também e ela, ou finge bem, ou de fato, se interessa.
Saímos juntos, levando ela para cada, sem promessas, mas com esperanças.
Ela mora numa casa antiga. O portão de ferro geme quando se abre. O carro entra, e exceto pelos faróis, não há luz alguma.
- Eles dormem, meus pais.
Ela vai descendo do carro e tento beijá-la. Ela coloca dois dedos em meus lábios e seu perfume me entorpece.
- Vem.
Eu sigo o vestido azul escuro na escuridão.
Ela me leva para o orquidário.
As flores crescem trepando nas árvores do local. Orquídias grandes, pequenas, de todo tamanho.
As árvores, no entanto, noto que estão mortas.
Olho para ela e ela sorri, percebendo minha confusão.
Noto então um outro cheiro, forte, masculino.
Mal tenho tempo de me virar. O sátiro me corta na virinha ao braço.
Ambos, a luz do luar, se beijam.
E olham para as orquídias, selvagens em sua fome, me devorando o sangue.
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1 comment:
Muito bom esse lance do perfume como armadilha, a caça, o twist no final. Só fica um gostinho de quero mais, tu podia estender mais teus contos, mais diálogos e reflexões.
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