June 23, 2012
Diprosopus
Ele faz a barba. Deixa o cavanhaque e o bigode. Antes de deitar, faz três ligações.
Liga para um colega de trabalho.
Liga para sua mãe.
Liga para sua esposa.
E espera Rosa.
Para o colega de trabalho, ele confidencia: outros querem tomar seus clientes. É por isso que riem dele no almoço. Planejaram como tomar suas contas e estão de olho em sua gorda comissão. O colega de trabalho agradece. Diz que sabia que podia contar con ele. Se conhecem desde o ensino médio. Ele se despede emocionado, afinal, são agora aliados quando todos na empresa parecem sem escrúpulos, canalhas.
Conversa com sua mãe por horas. Lembra ela do pai, de como ele a abandonou, maltratou. Lembra a ela de sua poupança, dos pagamentos que tem de fazer, de seus remédios. Pergunta se ela tem ido ao médico que ele recomendou. Ela confirma. Se despedem com muito amor. Mãe e filho, inseparáveis apesar da distância.
Ele liga pra esposa. Conversa bastante. Pergunta das crianças, como ela está, como foi seu dia. Pergunta se ela fez tudo que ele pediu, se ela precisa de algo. Lembra a ela de deixar sua roupa preparada, que ele selecionou meticulosamente, como sempre. Pergunta se ela tem se medicado, se passou algo na marca roxa na perna. Lhe assegura que tudo irá ficar bem e que irão conversar mais após essa viagem. Se despede falando em amor e mandando beijos para o casal de filhos.
Rosa chega após a meia noite. Conversam boa parte da madrugada. Trabalha duro. Ele é perfeccionista. Não quer deixar nenhum detalhe de fora. Depois deitam e fazem amor até o sol nascer. Ele acorda antes dela, usando um de seus talentos: sempre acorda antes da hora que marca no despertador. Olha a bolsa dela, pega o pequeno frasco. Troca as pílulas por outras. Cuidadoso, deixa a bolsa exatamente no mesmo ângulo que achou. Vai ao banheiro, dá descarga e volta pra cama.
"Tudo vai dar certo", ele pensa antes de dormir novamente.
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