June 23, 2012

Inquietações ursulescas


Estava conversando ontem com um colega sobre Ursula K Le Guin. Ele fez um comentário que me inquietou. Em suma, ele tem a impressão que poucas editoras se interessam pela autora. Eu não vou me dar o trabalho de fazer uma pesquisa sobre o histórico editorial de Le Guin no Brasil. Ele está certo. Afinal, tenho certeza que ela 1) teve pouca coisa publicada, 2) não deve ter vendido bem, 3) sequer poucas pessoas a conhecem.

FC não é um gênero tão popular no Brasil (quem quiser que tente me desmentir e jogue pedras). Horror, mesmo sendo outro pária literário, consegue muito mais atenção e até tem alguns best sellers, mas FC? Diferente do cinema, a literatura de FC não tem efeitos especiais, raramente é de rápido consumo (o space opera conseguia isso, mas o cinema substitui essa característica do gênero muito bem) e muitas vezes, no caso da "hard sci-fi", é muito técnica (o que imagino, gere também problemas de tradução, graças ao jargão especializado). Além do mais, Ursula não tem um nome tão facilmente reconhecível. Quem não ouviu falar de Asimov, por exemplo? Mas Ursula? Poucos. O curioso é que não é uma "autora menor". Ganhadora de vários Hugos e Nebulas, os maiores prêmios literários de FC, Ursula chegou até mesmo a ganhar, no mesmo ano, ambos, e por duas vezes (com os romances The Left Hand of Darkness e The Dispossessed). Se pode dizer que Asimov é atípico, afinal, não apenas ele construiu uma carreira como propagador da FC, mas pelo menos um filme baseado em seu livro teve muito sucesso (Viagem Fantástica). Asimov é tão atípico que é dos "três grandes autores de FC" ou dos "Três Grandes", é o único que todo mundo conhece. Afinal, quem conhece de imediato, só de ler/ouvir o nome, tanto Arthur C. Clarke quanto Robert A. Heinlein, os outros dois dessa trinca? Pois é, foi o que pensei. E não faltam filmes baseados em livros de ambos esses autores (2001, Starship Troopers, etc).

Outro grande "problema" de Ursula, é que ela é mulher. Por favor, não esqueça que usei aspas. Nâo acho que o fato dela ser mulher tenha qualquer impacto sobre sua qualidade, ou mesmo, temas. Ursula, escreve sim, de uma forma que busca sensibilizar o leitor, ela é muito, muito humana. Mas o mesmo se pode dizer de Orson Scott Card e Robert Silverberg, autores de FC se sexo masculino. Ela não escreve uma "FC diferente", ela não escreve "só para mulheres" (mesmo quando certos livros dela - The Left Hand of Darkness - tenha um caráter que erroneamente (IMHO) pode ser tratado como feminista). Porém o público leitor, e falo do público brasileiro, pode não pensar assim, por desconhecer a autora. Para o brasileiro, e imagino que essa seja a lógica dos editores, uma autora feminina não vai ter o caráter cinematográfico que outros autores de FC podem ter, ou o tecnicismo. Talvez eles estejam corretos. Talvez seja isso mesmo.

Enfim, meu ponto é: a despeito de Ursula não ter sido publicada no Brasil tanto quanto outros autores, procurem e leiam seus livros. Não esperem que ela, contando hoje com 82 anos, faleça, para aí sim, vão conhecer o que ela escreveu.

Bem, é isso. Estava inquieto e precisava tirar essa inquietação de mim. :)

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