May 26, 2013
20/25
Ele acorda.
No horário programado.
É um despertar calmo, induzido por drogas que o fazem despertar sem o choque do alarme.
Seu período de sono, é compatível com estudos que maximizam sua longevidade.
Jorge acorda para um mundo tranquilo.
- Bom dia. Deseja saber sua programação agora, ou após o desejum?
- Agora, por favor, Valéria.
- Há duas peças de teatro, trinta sessões de cinema, além de dois shows e uma apresentação circense. Especifico alguma?
- Algumas das peças, está marcada?
- Sim. “O Sonho de Narciso” começa em duas horas. Ainda há ingressos. Compro um?
- Reserve um, por favor. Pergunte a Cíntia se ela quer ir, por favor.
Seu café da manhã é preparado para suas necessidades, o que é evidente pelo seu corpo, que não exibe gordura em excesso, nem magreza. Ele escolheu não se exercitar muito, e mantém um corpo em forma, mas sem hipertrofia. Ele é feliz assim.
- Cíntia manda beijos e informa que, nesse horário, não é possível. Pergunta se pode se encontrar com o senhor a noite.
- Sim. Confirme. Compre, por favor, um ingresso. Ligue o carro para mim, por favor. Quero um banho quente. Vou vestir roupas no padrão salvo número cinco.
- Sim, senhor.
O Valet-E da casa obedece. Ela sente quando ele chega ao chuveiro e liga a água pouco antes dele entrar. Ela marca para os requisitos de AR de Jorge, apenas as roupas que ele deseja, efetivamente deixando as outras invisíveis para ele. Ele se veste e quando chega ao carro, está pronto para sair.
- O escritório informa que o senhor precisa de dois ciclos completos hoje para cumprir sua cota. Deseja programá-los para após o teatro?
- Sim, Valéria, por favor.
O carro leva Jorge sem grandes incidentes. Há um atraso em uma das vias, mas o sistema de navegação lhe dá informações atualizadas e lhe sugere rotas melhores e mais seguras. Ele chega e desce em frente do teatro. O sistema de estacionamento automatizado do local, guia o carro para uma vaga próxima.
No teatro, Jorge recebe convites, humanos e eletrônicos, baseados em seu profile, definidos como não invasivos pelo seu setup de AR. Ele entra, sem interferências, tendo sido checado desde que estacionou o carro.
A peça demora o tempo programa, 1h15min. É maravilhosa. O usa de hologramas e AR transporta o público para a cena. Narciso, muitas vezes, se torna, para cada espectador, ele mesmo. É uma catarse plena, de se ver, de fato, na história. Jorge chora, refletindo sobre sua vida, suas escolhas. Mas feliz e pensando em como ser uma pessoa ainda melhor, menos egoísta.
Na saída do teatro, o caminho é marcado em sua visão para que chegue ao carro. Ele abre a seu toque, já o tendo identificado a distância e conferindo sua identidade biometricamente. Ele resolve cochilar até o trabalho e deixa que o carro o leve em piloto-automático, com ar ligado e vidros com maior proteção contra luz.
Na fábrica, ele vai até seu grupo de trabalho, após vestir as roupas indicadas. Ele sempre sonhou em trabalhar ali e o faz a três anos. Ele entra na linha de montagem e começa a fazer pontos. A AR faz com que ele se veja em outro lugar, combatendo hordas de monstros, curando companheiros, enquanto realiza sua tarefa. Seu personagem virtual evolui, e com os pontos do dia, pode se beneficiar na empresa, dentro do jogo, ou mesmo, adicionar um bônus em dinheiro a seu salário pré-fixado. Ele fica um pouco além do horário da cota, mas é obrigado a sair trinta minutos depois. Há mais gente na fila de espera que deseja trabalhar.
Ele vai se encontrar com Cíntia na em Boa Viagem. Ela mandou instruções para ele através de seu Valet-E.
A praia, limpa e organizada, é dividida em setores. Ele procura um com comidas típicas e um rapaz o atende assim que desce do carro. Trocam IDs, ele informa que vai ser acompanhado. O rapaz o guia até um par de cadeiras onde olha o pôr-do-sol. Não precisava ser guiado até ali, uma linha de AR podia fazer isso, mas ele gosta do toque personalizado. E o comitê de turismo sabe disso, está nos seus bancos de dados.
Cíntia chega cinco minutos depois. Curte o momento com ele, sem se falar, apenas com emoticons, que, com o movimento de seus olhos e dedos, envia para ele que vê, no seu AR. Eles sorriem. Conversam sobre seus trabalhos, sobre leituras, filmes. Decidem ir para casa de Jorge, onde fazem amor e dormem.
Ele acorda.
O alarme toca com violência. O som, ele sabe, está dentro de sua cabeça, mas o mundo parece virado de cabeça pro ar.
Alguém hackeou seu AR enquanto invadiu a casa. A terceira invasão essa semana.
Ele pega a pistola, desliga o AR e salta para o chão. Embaixo da cama, um pequeno visor com um planta da casa, identificando o local dos invasores. O circuito é simples, não hackeável.
Jorge está acostumado e não perde tempo. Mata um sem que este saque o revólver, e manda mais dois projéteis na direção do outro.
- Pandora, ECM!
A casa obedece. O segundo assaltando deve estar sendo, por sua vez, assaltado. Seu AR sendo usado contra ele pela Slave-E de Jorge. O invasor perde apenas segundos para se ajustar, mas são os segundos que Jorge precisa para atravessar o corredor e matá-lo. Ele se apressa em copiar os IDs de ambos, comunicar a polícia que os matou em legítima defesa. Não deseja que um mandato seja expedito contra ele.
- Pandora, os IDs foram confirmados?
- Sim, senhor.
- O prédio está seguro?
- Há conflitos no terceiro e quinto andar.
- Ótimo. Nada sério então. Pandora, quanto tempo para meu turno?
- Ele começa em 27min.
- Merda. Tem água?
- Ainda em racionamento.
- Merda. Ônibus, algum que chegue logo?
- O itinerário foi hackeado. O planejamento é que um passe em 6min, mas não sei se lotado.
- Está bem, vou de carro.
- Tem certeza, senhor?
- Sim, tenho. Me avise sobre intrusos na garagem. Posso ligar o AR novamente?
- Não identifico mais interferências. Faço uma chamado para remoção dos corpos?
- Sim, mas mande recado para o zelador vir pegar aqui. O caminhão de lixo demorou muito da última fez.
- Bem observado, senhor.
Jorge entra no carro. Tem pouco combustível, não pode pagar para encher o tanque. Teve de comprar munição. Ele sai rápido, e seu carro segue uma rota de pequenos impulsos de velocidade, intercalados com minutes de engarrafamento. Há discussão nas ruas, algumas tentativas de assalto e roubo de carros. Mantém a arma sobre o colo, pronto para mais problemas.
Chega atrasado na fábrica. Sabe que pode perder seu direito de sábado, mas trabalha extra para garantir o descanso. O trabalho é monótono, cansativo. Há uma pequena pausa para o almoço, que ele come com pressa, evitando pensar no que comeu. Seu número é logo chamado, seu AR inundado pelo alerta amarelo de trabalho. Pouco depois de voltar a sua posição, é inundado de novo, dessa vez, o alerta é vermelho. Há uma tentativa de saquear a fábrica.
Jorge é rápido em aproveitar a oportunidade. Defender a fábrica é opcional, mas garante bônus. Ele mata dois saqueadores, garante seu sábado. E quem sabe, mais balas. Ele vai saber a noite, se sobreviver a ela.
Ele sobrevive, mas exausto. Não quis arriscar, as vezes os bônus não são computados e ficou até tarde no trabalho. Quando chega em casa, os corpos foram removidos, mas o apartamento ainda não foi limpo. Falta água.
Cansado, sujo, deita para dormir assim mesmo. Ele sabe, porém, que o dia ainda não acabou.
- Cidadão Jorge 34B57JKM4.
- Confirmo.
- O cidadão Jorge 34B57JKM4 eliminou quatro pessoas hoje?
- Confirmo.
- O cidadão Jorge 34B57JKM4 está ferido? Necessita de cuidados médicos?
- Não.
- O cidadão Jorge 34B57JKM4, deseja munição ou bônus em servições médicos?
- Munição.
- O cidadão Jorge 34B57JKM4 prefere receber pela manhã, ou nos próximos 45min., mediante redução da munição?
- Próximos 45 minutos.
- O Governo de Pernambuco e Secretaria de Ação Social agradece a atenção do cidadão Jorge 34B57JKM4. Sua munição chegará em breve. Pedimos que esteja alerta quando for entregue.
- Confirmo.
Jorge espera, deitado. Quando é avido pelo AR que a equipe chega, se arrasta cansado até a porta. Recebe a munição para a arma magnética e fecha a porta, indo, finalmente, dormir.
Ele acorda.
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