May 26, 2013
Em toada
O ombro de Zé se levanta e abaixa. Ondas de um mar. Caravelas.
O bracos entram e saem. Nadando para a praia. Boa viagem.
O baque é forte e ressoa. É o baque que sangra. A mão, mão no tambor.
O suor é salgado. È água do mar. Que vai e volta.
O olhar de Zé. Cuspindo salgado com dente. O tambor batendo.
O coiso chega. Carregado do mar. Trazido no batuque sangrado.
Zé pega o revolver e olha o orixá no olho.
O pai de santo ainda grita, quando o revólver cospe firme.
Taram tantã. Taram tantã. Taram tantã.
O negrinho corre. O terreiro queima. É ódio, é vento.
O mote é medo. A batida quente. O corpo no chão se esborra.
O pé resvala na ladeira. O morro para trás vai ficando. O cheiro do mar permanece.
O cão nos seus joelhos morde. Zé sente fraqueza e dor. Se mija na ladeira estreita.
O orixá vem explodindo. Danado desrespeitado. Decidido, dando dor.
O negrinho se espreme no mundo. A sandália crua lhe pisa o peito. O ar se faz cimento.
Zé cospe na noite e grita: “Me liberta, maldita!”
O chão parece virar, de baque que ele leva nas pedras, mas livre fica das pernas.
Taram tantã. Taram tantã. Taram tantã.
Ele corre no ritmo do batuque. O deus que lhe socorre os pés, não é pior que o que lhe rasga os calcanhares. E tudo isso ele sabia, quando apostou o sangue para vingar seu irmão.
Quando ele chega no mar, o barco ainda não virou. As rochas parecem sustentar ele, em vez de quebrá-lo quando jogado pelas águas. Ainda pulando e correndo no ritmo do batuque, o negrinho se joga no ar, que o sacode e o faz rebolar.
Quase quebrado, no convés deslizante, ele liga o motor e o som, fazendo com o batuque seja escutado alto. O orixá o deixa passar. Indo então de encontro ao mar.
Taram tantã. Taram tantã. Taram tantã.
São dois dias antes.
Quatro dias depois.
- Ele matou Ricardinho, mãe!
- Meu filho, você vai se mexer com essa gente? Como?
- Não sei, mas vou, mãe.
Ele sai desengonçado. Amaldiçoado de dor. O irmão, morto sem dó, rolado ladeira sem enfim, sem olhos no fim do caminho.
A mãe do santo que ele procura, com quem já se deixou em loucura, o vê sem gosto ou amor, perdidos num passado sem cor.
A melodia do luto conquista, o que a lábia do lençol não sustenta e ela promete serviço, na guerra de que santos for!
Taram tantã.
Taram tantã.
Taram tantã.
Armado de pólvora e fé, o negrinho espera a maré, como santa mãe lhe instruiu.
Pecado maior não há, que dançar sem o passos dar, na ordem da África da rua.
Espera em um barco obrigado, animal lá sacrificado, para mais sangue fazer derramar.
Na noite chegada mansa, cantando a toada e fazendo dança, foi o pai de santo matar.
Taram tantã. Taram tantã. Taram tantã.
São sei dias antes.
Taram tantã.
A droga corrompe até a dança.
Taram tantã.
Que o terreiro dizia abençoar.
Taram tantã.
Ricardinho, irmão do negrinho, é avião por lá.
Obedece seu amor, o pai do lugar.
E cai como boi, pras piranha devorar.
Taram tantã. Taram tantã. Taram tantã.
As bala bate violenta, na carne penetra intenta, ao menino matar.
Uma dívida é feita então, pelo irmão, que há de se cobrar.
Taram tantã. Taram tantã. Taram tantã.
E na justiça do mundo, sagrada na noite, no fundo.
Sangrada nos irmãos de promessas, cobradas com juros de raiva. Foi.
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