September 25, 2013

Ecos


Ouço o elevador chegando, a porta abrindo, seus passos, a procura pela chave na bolsa. Ela sempre busca chave na bolsa quando chega a porta. A chave desliza, encaixa, gira e ela entra.
O miado dança no ar, as gatas disputam suas pernas.
- Boa noite, amor.
Ela olha para frente e continua até a cozinha. Tira os chás do armário, escolhe um deles, guarda os outros de volta e, com cuidado, fecha novamente o móvel. Ela dá aquele jeitinho que nunca aprendi, empurrando de leve para cima e para frente, encaixando a portinha perfeitamente.
A chaleira vai fervendo a água e começa a música do evaporar. O fremir da água com o metal, o estourar da pressão, o vapor que escapa. Há um mundo sensual ali, num simples esquentar da água.
Ela só tira a roupa quando chega na cama, depois de colocar o chá na mesa de cabeceira. O seu cheiro se confunde com a da cidreira, um suor da terra, um voltar.
O lençol se dobra tão devagar, um raspar de seu quadril e pernas, o contorno perfeito. Ela bebe o chá, devagar, em silencioso sorver.
Tira a blusa que tinha aberto. Termina de se desvencilhar da saia. Tira a calcinha e o absorvente, os empilha em uma cadeira. Tira a meia e junta todos em seus braços, levando tudo para o banheiro, onde deixa numa cesta a roupa e joga o absorvente numa lixeirinha.
A água logo canta a sua volta. A torneira, o vaso, o chuveiro. As gotas que caem de seu corpo, escapando de seu enxugar, as vezes caótico, as vezes, meticuloso.
Ela vai na cozinha, só de toalha. O chinelo, com aquele som de sucção, marca sua ida e volta. Notei, do quarto, ela bebendo água. Seus lábios ainda chegam úmidos.
Ela se deita, puxa um travesseiro para si, depois outro. Joga a toalha na cadeira, se cobre apenas com o lençol.
- Eu te amo.
Uma das gatas sobe na cama e deita em seus pés. Isso lhe dá um pequeno susto, acompanhado desses pequenos longos suspiros de alívio.
O som de seu exalar. Dos sons que lhe imagino fazer, é o que me é mais caro na memória.
Poderia sonhar com seu gozo, seus gritos de prazer, sua risada deliciosa.
Mas é dos sons mais simples que lhe sinto falta.
E é quase hora.
Meia-noite.
O alarme toca.
Ela some.
Estou só no quarto. As únicas marcas no lençol são as minhas.
A toalha dela está onde ela a deixou.
As gatas olham para mim como que esperando algo que não posso dar. Um calor diferente.
Os minutos correm lentos e me parece que quanto mais penso neles, mais devagar se move o ponteiro do relógio.
Toca o telefone.
- Oi, quem é?
- Você é muito engraçadinho.
Ouço o sorriso no tom da sua voz. Ele é largo, lindo.
Ela está longe, mas vai voltar. É questão de tempo.
Até lá, lhe deixo passear no apartamento, vou vivendo ao lado de sua memória.
E enquanto conversamos, sou eu que suspiro de saudades.

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