May 11, 2015
E.2
Estamos tão distantes de tudo. Um do outro, de nós mesmos. Não vamos nunca. nunc. nun. nu. n.
Estacionário. Suspenso. Levado para análise. Liberado. Solto.
E ele voltou. Em meio a festa, em meio ao nunca, quase engasgando. Olhou para as pessoas a sua volta que esperavam que ele concluísse o raciocínio, mas foi em vão. Se percebeu perdido e encontrado, desligado do mundo e ao mesmo tempo, mergulhado e tentando poder respirar dentro de, bem, tudo. Lembrou, nesse instante, agora, do que estava dizendo antes e poderia concordar e até voltar a conversa anterior, mas sentia-se eviscerado, tudo seu lhe parecia exposto. A estupefação lhe tomou conta. Havia um mundo ali! E ele saiu para a varanda.
Sentia o ar lhe tocar o rosto e lembrou de ambas, carícias e violências, ambas desferidas e sustentadas. Olhava a cidade de eucaliptos rochosos a seu redor. Uma era de ignorância, onde todos podiam se conectar, eletrodos todos de uma imaginação limitada, energúmenos possuídos pelas máquinas que carregam e as quais devotam suas vidas. Sentiu nojo de si e vomitou prédio abaixo.
Escória. Escória do mundo. Se vê parte de tudo e corre para o meio da festa, com olhos alucinados. Sente a ereção e o esperma que logo escorre. Sente tudo. Não há escrúpulos nas nuvens. Sente tudo. Busca o elevador, a escada, quer respirar. Sente tudo. Sabe-se extenso, tocando com tentáculos de percepção que nunca teve, tudo. Sente tudo. Cai, mas levanta, corre. Vomita de novo. Suas estranham parecem querer escapar, sua carne parece crescer, berrar contra si, uma elefantíase que busca independência. E no correr, cair, levantar, correr, ele escorrega pelas escadas, inchando e mudando.
A massa que chega ao térreo logo se torna de novo, homem. Mas um homem novo. Ele não reconhece a si. Não tem medos. Mas suas chagas estão aberta. Cada dor, cada memória, cada crime cometido e sofrido com seu eu e a realidade do outro. Ele escorrega para as sus e sente o sol queimar sua pele que fumaceia. Ele corre para o buraco mais próximo, se esconde nas sombras.
Ele sente que tudo que fez foi tão estúpido. Como foi cruel. Como se deixou enganar. Lhe brotam escrúpulos, ali mesmo nas sombras.
- Eita, mãe!
- O que é filha?
- O homem.
- Anda, é só um viciado.
- Viciado?
Ele escuta com vergonha. Pois fora. A esbórnia que fora sua vida até aquele momento, concentrada no vício de destruir outras vidas. Todos em seu meio faziam o mesmo. Sorriam em eventos beneficentes enquanto exploravam e matavam indiretamente. davam tapinhas nas costas uns dos outros, com as mesmas mãos que assinavam documentos que iriam desabrigar milhares. A empatia só não era ausente no que tangia o disfarçar de sua verdadeira natureza, uma imposição social de uma cultura em que as aparências alinhadas a uma ética religiosa, silenciosamente servia para justificá-los como eleitos em um mundo em que a grande massa era escrava de seus desejos. Encasquilhados em arranha-céus, no qual suas fundações se erguiam sobre ossos brancos de pardos e negros, eles bebiam e comiam o que negavam ao mundo.
Um intenso desejo de se confessar lhe enchia o ser, e vencendo o desejo da vergonha, e agora limpo das barreiras que sempre o tornaram evasivo a vida, andou o extenso caminho entre a sombra e a luz. Olhou para as pessoas na sua e começou a falar:
Estamos tão distantes de tudo. Um do outro, de nós mesmos. Não vamos nunca. nunc. nun. nu. n.
E seu corpo se ergueu no ar, e em mil partículas invisíveis ao olho nu se tornou.
Estacionário. Suspenso. Levado para análise. Decomposto. Excretado.
Irredimido.
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